Nesta postagem, abordarei um tema cada vez mais presente na dinâmica familiar, que muitas vezes não é plenamente compreendido.
Na postagem anterior, discuti a fase do egocentrismo (momento em que a criança acredita ser o centro de tudo) e a importância da maneira como cada família lida com essa fase.
É importante lembrar que a criança nasce em um estado de vazio informacional, e são os pais os responsáveis primários por sua educação. O que a criança se tornará será consequência direta da educação que recebeu.
A criança, inicialmente, não possui qualquer noção de valores, de certo ou errado. Cabe aos pais, de maneira gradual, ensinarem ao filho o que é adequado ou não em uma convivência social. Portanto, quando uma criança manifesta um comportamento extremamente desafiador, chamando a atenção de todos ao seu redor, existem duas possibilidades: ou os pais cederam facilmente aos desejos da criança, ou ainda não esclareceram de forma adequada que a vida é regida por regras. Claro que é muito mais fácil dizer "sim" do que "não", e é mais vantajoso ser considerado o "pai ou mãe legal" do que ser rotulado como "chato". Por essa razão, muitos pais têm dificuldade em estabelecer limites, em dizer "não", sem saber até onde podem ir. Quando não deixamos claro desde cedo o que é aceitável ou não, não podemos esperar que a criança consiga controlar suas emoções quando tiver um desejo negado, já que nunca foi explicada a razão por trás da proibição.
Educar, em sua essência, é também frustrar. Através da frustração, a criança vai desenvolvendo a noção de valores, normas e regras sociais. Isso não exige uma postura severa, mas a capacidade de demonstrar gradualmente que nem tudo é possível e que elas não estão sozinhas no mundo.
A seguir, apresento algumas recomendações práticas:
- Não ofereça colo toda vez que solicitado. Permita que a criança espere um pouco.
- Ensine a criança a aguardar até que você termine uma conversa para atendê-la.
- Não se apresse em atender a todos os desejos de consumo do seu filho, como no caso de mamadeiras ou brinquedos.
- Não atenda todos os desejos imediatos e impulsivos do seu filho.
Essas pequenas frustrações diárias ajudam a criança a entender, de maneira tranquila, que é necessário esperar sua vez, que nem tudo é possível e que é preciso dividir a atenção dos pais com outras demandas.
Esse tipo de abordagem facilita a passagem da criança pelas diferentes fases do seu desenvolvimento, muitas vezes de maneira mais serena, pois ela já está acostumada a lidar com as normas sociais. Crianças que são educadas com a noção de limites tendem a transitar pelas diversas fases do desenvolvimento de maneira mais equilibrada, sem se incomodarem com os ajustes que a sociedade exige.
Contudo, nem sempre a realidade familiar segue esse padrão. Em minha experiência clínica e escolar, frequentemente encontro dinâmicas familiares que adotam uma abordagem contrária, tratando os filhos como se fossem o centro do universo, atendendo a todas as suas vontades e colocando-os sempre em primeiro lugar. Alguns pais até se referem aos filhos como "reizinho", mas esquecem de explicar que o mundo não funciona como um castelo.
Tenho observado, ainda, que muitas mães se preocupam quando seus filhos são mordidos na escola, mas muitas vezes esquecem que seus filhos também mordem outras crianças. Isso caracteriza um julgamento desigual, como se as situações só fossem relevantes quando envolvem sofrimento ou desconforto para os filhos deles. Na escola em que trabalho, mantemos uma comunicação constante com as famílias, notificando-as sempre que seus filhos mordem ou são mordidos. No entanto, algumas famílias só nos procuram quando ocorre a segunda situação. Esse é um exemplo clássico de um perfil familiar que acredita que tudo deve acontecer a seu favor.
Quando a criança entra em fase de negação, pirraça, egocentrismo, é fundamental que os pais estabeleçam limites claros e mostrem que existe um mundo à sua volta que precisa ser respeitado. A facilidade ou dificuldade para lidar com essas fases depende das experiências familiares que a criança vivenciou até então.
O ser humano é extremamente complexo, e por isso, não devemos nos sentir culpados ou fracassados quando algo não vai bem. Muitas vezes, é difícil enxergar a solução quando estamos no meio de um conflito. Se perceber que as coisas estão saindo do controle, é importante buscar orientação profissional.